terça-feira, 14 de setembro de 2010

Defenestrando Obsessões

A Bruxa, poema de Carlos.
A Bruxa 

Nesta cidade do Rio 
De dois milhões de habitantes 
Estou sozinho no quarto 
Estou sozinho na América. 

Estarei mesmo sozinho? 
Ainda há pouco um ruído 
Anunciou vida a meu lado. 
Certo não é vida humana, 
Mas é vida. E sinto a Bruxa 
Presa na zona de luz. 

De dois milhões de habitantes! 
E nem precisava tanto... 
Precisava de um amigo, 
Desses calados, distantes, 
Que lêem verso de Horácio 
Mas secretamente influem 
Na vida, no amor, na carne. 
Estou só, não tenho amigo, 
E a essa hora tardia 
Como procurar amigo? 

E nem precisava tanto. 
Precisava de mulher 
Que entrasse nesse minuto, 
Recebesse esse carinho 
Salvasse do aniquilamento 
Um minuto e um carinho loucos 
Que tenho para oferecer. 

Em dois milhões de habitantes 
Quantas mulheres prováveis 
Interrogam-se no espelho 
Medindo o tempo perdido 
Até que venha a manhã 
Trazer leite, jornal, calma. 
Porém a essa hora vazia 
Como descobrir mulher? 

Esta cidade do Rio! 
Tenho tanta palavra meiga, 
Conheço vozes de bichos, 
Sei os beijos mais violentos, 
Viajei, briguei, aprendi 
Estou cercado de olhos, 
de mãos, afetos, procuras 

Mas se tento comunicar-me, 
O que há é apenas a noite 
E uma espantosa solidão 


Companheiros, escutai-me!
Essa presença agitada
Querendo romper a noite
Não é simplesmente a Bruxa.
É antes a confidência
Exalando-se de um homem. 

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